Um belo dia, do nada, uma notícia.
Vocês se lembram, alguns anos atrás, quando comecei uma (extremamente) frustrante pesquisa para descobrir o que teria acontecido com a família do meu pai durante a II Guerra Mundial? Caso vocês não se lembrem ou não me conhecessem – mas tenham interesse pelo assunto – são estes os posts que escrevi: aqui, aqui e aqui.
Como minhas pesquisas in loco não deram muito resultado – imaginem o serviço público de um país do leste europeu e imaginem a dificuldade da língua – eu contratei uma pessoa recomendadíssima, a um preço exorbitante, para fazer a pesquisa por mim.
Pesquisa que, afinal, não me rendeu nenhuma ou quase nenhuma nova informação. Tanto que já havia decidido esperar a inauguração do Museu do Holocausto, em Varsóvia (que aconteceu este ano) para fazer uma nova busca. E, enquanto isso, arquivei o assunto numa daquelas gavetinhas que ajudam a coisa doer menos.
E o tempo passou. Até que, na insônia de duas madrugadas atrás, abro o computador e me deparo com um email inacreditável. Um historiador australiano, num trabalho de pesquisa para seu segundo livro sobre a guerra, veio a saber de um judeu que teria fugido de Varsóvia para o Japão graças a um visto que lhe teria sido fornecido por meu pai. E me escreveu perguntando se eu por acaso era filha dele.
Terminada a leitura, fiquei imóvel um bom tempo. Perplexa. E então chorei, me perguntando: como teria ele… como teria esse historiador chegado até mim? E só aí me lembrei: a foto que eu havia tuítado no último Dia dos Pais! Henryk Grynblat era top of the list no google. E o incrível é que eu nunca havia feito isso, quer dizer, nunca havia citado meu pai e muito menos postado uma foto dele.
Preciso dizer o quanto fiquei tocada? Depois, mais calma, achei prudente fazer um double check. Com o mesmo google, fui procurar mais informações a respeito do autor e do livro dele. E o que eu achei só aumentou minha emoção. Sem falar que reacendeu minha esperança de saber mais sobre meu querido pai.
O que descobri? O Cônsul do Japão na Lituânia, Chiune Sugihara, foi a versão japonesa do Oskar Schindler: graças a ele, mais de 6.000 judeus escaparam do nazismo na Polônia. E nesse grupo estaria meu pai: ele recebeu o visto de número 621, em 01/08/1940. E teria chegado a Kobe, no sul do Japão, em 13/02/1941.
Informação importante: o Japão era uma etapa intermediária. De lá, os membros do grupo deveriam se dirigir ao destino final. Que era mais frequentemente Curaçao ou Suriname, à época colônias holandesas.
Bem, ao que tudo indica, a essa altura meu pai já teria no bolso um visto para a Palestina. E o que é que ele teria feito, então, com o documento que o levaria para o Caribe? Ele usou num jogo de cartas e teria perdido para Oscar Grimberg – cuja história, através de um descendente, chegou aos ouvidos do historiador australiano.
Parece cinema, eu sei, mas o episódio faz sentido: meu pai cultivava o risco; o gambling fazia parte de sua natureza.
Bem, e o que fez ele depois disso? Usou seu visto para a Palestina? Surpreendentemente, não usou nem se sabe que fim teria levado o documento. O que se sabe é que ele mudou para Shanghai, onde teria chegado em maio de 1942 e onde teria sido confinado num gueto chamado Hongkou. Quando e de que maneira ele teria escapado deste gueto, eu ainda não sei. Como, infelizmente, ainda não sei tanta coisa.
Em Shanghai ele casou uma primeira vez; divorciou-se; casou uma segunda vez (com minha mãe) e em 1950 foram os dois para Hong Kong à espera de um visto que os safasse do comunismo recém-instalado na China. Tiveram que esperar até 1955 e aceitar um passaporte branco de apátrida, que não era o ideal mas de qualquer maneira era um bilhete de entrada para a liberdade. Já no Brasil, tanto ele quanto minha mãe adquiriram a cidadania brasileira dois ou três anos depois que eu nasci.
Por enquanto, é tudo o que sei. Uma história cheia de lacunas que eu – tenho certeza – ainda vou conseguir preencher. Mais ainda com uma ajuda como essa do William Hastings Burke. A quem agradeço de coração por ter-me revelado um pouquinho mais da história de meu pai.
CarlaZ
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Marcie,
5 de novembro, 2012To realmente tocada com essa história. De alguma forma sabia que tinha uma confusão com a história dos seus pais, mas não sabia exatamente o que era. Li os posts todos e fiquei emocionada. Emocionada com essa sua busca e a vontade de saber o que realmente aconteceu com seu pai. Emocionada por vc ter descoberto mais um pouquinho com esse historiador. Foi uma boa conquista.
Realmente poderia dar um filme.
Beijos!
abrindoobico / Author
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Muita emoção, Carlinha.
6 de novembro, 2012Obrigada. Beijossss
Lucia Malla
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Uau!!! Simplesmente uau! Emocao demais!
5 de novembro, 2012abrindoobico / Author
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Muita, Lucia!
6 de novembro, 2012Claudia Beatriz - Aprendiz de Viajante
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Nossa.. eu não sabia de nem um pedacinho desta historia e agora, aqui com o layout novo, achei aquela seção lá em cima e fui futucar pra ver o q era e estou aqui de coração na mão.
18 de novembro, 2012Essas histórias de busca de passado são interessantíssimas… na torcida pra que vc preencha as lacunas. Haja coração!
Douglas Sawaki
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Marcie, li esse post e os outros 3 anteriores. Deu um arrepio e só tenho a dizer que espero que você encontre as respostas que procura!
18 de novembro, 2012abrindoobico / Author
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Obrigada, Douglas.
18 de novembro, 2012Manu Tessinari
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Marcie,
Que história mais linda!!!! Eu não conhecia ainda… Estou aqui no sofá com Toninho e, de repente, estava lendo em voz alta e nós nos emocionando a medida que a história ia se desenrolando.
Olhos cheios de lágrimas…
beijos,
18 de novembro, 2012Manu
abrindoobico / Author
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Emocão demais, Manu.
18 de novembro, 2012Tiago dos Reis
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Caramba, Marcie! Também não sabia dessa história. Imagino a sua aflição e angústia!
18 de novembro, 2012Vou torcer para que você consiga evoluir nessa busca e resgatar a história do seu pai!
abrindoobico / Author
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Obrigada, Tiago.
18 de novembro, 2012Lillian Brandão
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Muito emocionante seu relato, Marcie. Espero que você consiga saber mais informações.
18 de novembro, 2012Ricardo Freire
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que lindo!
20 de novembro, 2012Tati Akamine
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Já pode chorar?
7 de dezembro, 2012Claudia Matoso
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Oi Marcie! Depois de muito tempo acessando o Abrindo o Bico so pelo celular hoje abri no computador e consegui ver o layout novo. “Fuçando”, cheguei nesta aba. Realmente impressionante a historia do seu pai, da sua família. Espero que você consiga novas informações e para ir costurando as lacunas. Bj.
27 de dezembro, 2012Carina Senzatia
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Que história, Marcie! A vida é assim, nos da as respostas quando estamos preparados para elas. Quem sabe esta é a hora certa pra vc saber tudo que deseja.
11 de agosto, 2014Torcendo muito para que aos poucos todas lacunas sejam preenchidas.
Um beijo enorme pra vc!
abrindoobico / Author
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Obrigada, querida!
11 de agosto, 2014Beijo procê também! 😉
Jr Caimi
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Que história!! Apesar de toda dramaticidade e tristeza destas histórias de guerra e nazismo e afins, eu acho elas incríveis… Aqui em Curitiba tem o Museu do Holocausto, o primeiro do gênero do Brasil… vale a pena conhecer e se precisar de algo por aqui só falar 😉
11 de agosto, 2014abrindoobico / Author
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Eu não sabia disso, Jr. Vou lembrar para o caso de eu ir.
Obrigada! 😉
11 de agosto, 2014Erik Araújo
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WOW! Tocante! 😀
11 de agosto, 2014abrindoobico / Author
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Não é? 😉
11 de agosto, 2014Gustavo - Viajar e Pensar
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Que quebra cabeça moça, é um mundo dentro de uma família.
Que história!!
11 de agosto, 2014@GusBelli
maria lucia
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Marcie, após conseguir todas as respostas, a grande homenagem ao seu pai será um livro escrito pela filha corajosa, determinada e perseverante de Henryk Grynblat, você. Shalom.
31 de outubro, 2016abrindoobico / Author
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Quem sabe, né, Maria Lúcia… 😉
7 de novembro, 2016Marcelo
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Marcie, muito bacana sua história e o mais legal é que na década de 80 trabalhei na Johnson & Johnson e conheci sua mãe, na época secretaria do presidente da Johnson e Johnson, José Gimenez Sanchez. Soube, na época, que ela nascera na China e isto sempre me intrigou. Agora entendo melhor!
27 de junho, 2022Marcelo
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Marcie, conheci sua mãe na J&J no final da década de 1970 e início de 1980; na época ela era secretaria do presidente, José Gimenes Sanches. Na época soube que havia nascido na China e somente agora, por meio de seu blog pude entender melhor.
28 de junho, 2022Marcelo
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Marcie, conheci sua mãe na J&J no final da década de 1970 e início de 1980; na época ela era secretaria do presidente, José Gimenes Sanches. Na época soube que havia nascido na China e somente agora, por meio de seu blog pude entender melhor.
28 de junho, 2022